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O acervo do Escritório do Plano de Urbanismo da Cidade de Salvador será reaberto ao público

Foto da professora Ana FernandesA partir da próxima quarta-feira (14), o acervo do Escritório do Plano de Urbanismo da Cidade de Salvador (EPUCS) será disponibilizado para acesso público. Na mesma data será lançado o livro Acervo do EPUCS: Contextos, Percursos, Acesso, organizado pela professora Ana Fernandes, da Faculdade de Arquitetura da UFBA. O acervo do EPUCS possui mais de 4.600 itens e sua recuperação é resultado de um trabalho de 10 anos coordenado pela professora que, em entrevista ao CAU, conta como foi a organização desse material e o que ele representa para a história da cidade e do urbanismo na Bahia

CAU: Como foi o processo de organização do acervo?
AF: O acervo estava indisponível desde a década de 80 na Prefeitura Municipal, mas só em 2004 eu realmente comecei a trabalhar nele, quando vi que estava absolutamente deteriorado e decidi que alguma coisa deveria ser feita. Inicialmente tive a ajuda de apenas 2 bolsistas de iniciação científica da Faculdade de Arquitetura e nós começamos a cuidar de uma parte do acervo, que era o textual. Continuamos neste processo até que em 2006 o Acervo Histórico Municipal conseguiu mais recursos junto a FAPESB para apoiar o projeto.
Mas o grande diferencial veio com o apoio da Petrobras Cultural em 2008 porque a partir daí tivemos condição de estender o trabalho do acervo textual para as fotografias, as plantas e os livros. Posso dizer que o processo de organização em si começou conhecendo mesmo o acervo, que é muito vasto, são cerca de 30 mil páginas só em documentos escritos.
Outra coisa interessante deste trabalho foi que tivemos que estabelecer um diálogo constante entre duas formações muito diferentes, que são a de arquitetos e urbanistas; e a de arquivistas e bibliotecários, pois este foi um trabalho realizado em conjunto. Além disso o trabalho nos exigiu muito fisicamente, pois tivemos que nos defrontar com esse acervo para limpar, recuperar, catalogar e acondicionar os materiais nas condições corretas para preservação.

CAU: Em quais condições o acervo estava disposto?
AF: A documentação textual estava em boas condições, precisamos apenas limpar a acondicionar. E aqui vale registrar que uma coisa que nos chamou a atenção foi a excelente qualidade do material produzido nos anos 40. Talvez se este acervo tivesse sido criado com os materiais utilizados hoje, ele não tivesse sido tão bem preservado.
No caso das plantas o cenário é mais dramático, pois elas tinham passado por um processo de manuseio muito cruel, estavam amassadas, rasgadas e várias se perderam. Nesta recuperação contamos com o apoio do Arquivo Nacional, inclusive fizemos uma oficina de Estabilização de Rasgos e Recuperação de Plantas para nos ajudar neste trabalho. O resultado é que hoje temos 347 plantas que estão completamente recuperadas e acondicionadas em mapotecas especiais com até 2,40m de comprimento, pois as plantas são muito grandes.
Já as fotografias, que também foram catalogadas, estavam em excelente estado e preservaram as informações quase que completamente.

CAU: Como as pessoas podem ter acesso ao acervo?
AF: As fotografias e as plantas foram digitalizadas em alta resolução, de modo que possam resistir à ampliação, para que o acesso ao documento físico seja o menor possível. Se você já tem a informação no meio digital, dificilmente será necessário manusear esse material, exceto em casos excepcionais. Já o acervo textual não foi digitalizado.
As pessoas poderão consultar esse acervo presencialmente no Arquivo Histórico Municipal de Salvador. Para todos esses materiais foram criadas fichas de catalogação que estarão disponíveis no site do arquivo, de modo a facilitar a pesquisa.

CAU: Além da UFBA, quais organizações apoiaram este trabalho?
AF: Na parte do financiamento tivemos o apoio da Petrobras Cultural, CNPQ e FAPESB. A realização foi um trabalho conjunto entre a Faculdade de Arquitetura da UFBA, o Arquivo Histórico Municipal e a Fundação Gregório de Matos. Além disso, tivemos o apoio do Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFBA, do Arquivo Público do Estado da Bahia e do Arquivo Nacional. É muito importante ressaltar que um trabalho dessa natureza não se faz sozinho. É preciso o envolvimento e a dedicação de muita gente.

CAU: Quais foram os projetos mais importantes encontrados? Existe algum que seja mais curioso ou tecnicamente diferenciado?
AF: Então, na verdade a pesquisa de fato vai começar agora, quando os documentos já estão recuperados. Imagino que ainda irão surgir muitas teses, dissertações de mestrado e doutorado interessantes. Mas uma coisa que merece ser reconhecida é o trabalho excepcional realizado pelo EPUCS, afinal de contas ele foi o primeiro plano geral urbanístico construído para a cidade, ainda na década de 40 e após várias tentativas que não deram certo.
Este plano é de uma complexidade raramente encontrada em outros planos. A conceituação da cidade que é utilizada é antecipatória, por seu caráter abrangente, pois contempla, entre outros, desde os sistemas de transporte até as formas de habitação e a questão da distribuição de água, ou seja, ele observa todas as variáveis que influenciam a cidade. Além disso é criado um sistema de trevos que norteia a forma como os bairros deveriam ser estruturados, tudo de forma integrada. Outra questão que se destaca é a qualidade gráfica deste plano, pois seu desenho é quase uma obra de arte, possui um alto nível de sofisticação.

CAU: Houve alguma surpresa na organização deste acervo?
AF: Uma das grandes expectativas que tínhamos era de encontrar as maquetes que pertenciam ao acervo, entretanto todas foram destruídas. Elas eram instrumentos de trabalho extremamente importantes para o EPUCS, principalmente numa cidade como Salvador onde você tem uma topografia tão acidentada. Essas maquetes, topográficas e de esquemas, chegaram até a ser expostas no início dos anos 50, mas hoje encontramos apenas fotos delas.

CAU: O acervo tem alguma característica dominante?
AF: De novo eu digo que o mais impressionante neste trabalho é a complexidade do plano criado pelo EPUCS. Era um projeto ousado porque a ideia deles era que para você pensar a cidade e seu desenvolvimento era necessário analisar todo um conjunto de situações, não bastava simplesmente sentar e desenhar um plano. É muito bom podermos reencontrar essa cidade do Salvador dos anos 40 de forma tão bem documentada.

CAU: Após a conclusão de um trabalho de quase 10 anos, qual reflexão você faz sobre o resultado obtido?
AF: Para mim está claro que uma política pública de preservação não pode ser feita se não houver um interesse e uma problematização por parte de várias entidades da sociedade civil juntamente com o governo, universidades e intelectuais de forma geral. Sem dúvida é necessário um esforço conjunto no sentido de recuperar e disponibilizar os acervos que ainda nos restam, pois isso vai gerar produção de conhecimento e aumento da inteligência coletiva. Para você ter uma ideia ainda temos mais de 600 plantas do EPUCS que precisam ser recuperadas, ou seja, ainda temos muito trabalho pela frente.

 

 

 

 

 

 

 

Fonte: CAU/BA
Publicado em 12/05/2014

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